quarta-feira, 24 de março de 2010

Erros de ‘casting’

.
Por Catarina Fonseca

NÃO, NÃO TEM NADA a ver com o cinema. Ou melhor, tem a ver com o ‘filme’ da nossa vida. Sabe aquelas pessoas que achámos fantásticas e depois percebemos que não eram o que esperávamos? Cá ficam algumas desilusões por que quase todas passámos.

Afinal, as nossas primeiras impressões nem sempre são muito apuradas. Enganámo-nos, por exemplo, nas seguintes:

- A Mulher a Dias Tradicional

Situação: Ao fim de uns meses a jurar que conseguíamos fazer tudo sozinhas, era o que faltava, naquela casa nunca entraria mão alheia, ao fim de sonharmos anos e anos que, no dia em que tivéssemos casa nova, ela ia cheirar a cera e a maçãs, a realidade cai-nos em cima com todo o seu peso de realidade (costuma ser muito). Não só não conseguimos fazer tudo sozinhas como a casa, se cheira a alguma coisa, é aos ténis do Paulinho e a porcaria entranhada, nada que lembre remotamente cera ou maçãs.

Sonho: Ao fim de muitas investigações, decidimos contratar a Odete. A Odete é a mulher da nossa vida. A Odete tem a cara e o aspecto que tinham todas as empregadas dos filmes, e só não anda fardada porque, enfim, já era um bocadinho demais. Mas quando chega a casa e vê a roupa lavada, tem vontade de beijar a Odete na boca.

Realidade: Ao fim de uns dias, a roupa demora um bocado mais a ser lavada. Há bolinhas de cotão por todos os cantos. A Odete deu em fiscalizar a sua vida e torce os cantos da boca de cada vez que você lhe diz. Ó D. Odete, por favor não me arrume os cds que eu gosto de os ter espalhados. No dia seguinte, os CDs estão outra vez empilhadinhos e você já não sabe onde tem nada. A Odete queima-lhe equipamentos de ginástica à velocidade da luz, porque ainda não percebeu que há certas coisas que não gostam de ferro. A Odete acha que você é uma galdéria que não sabe o que a vida custa a ganhar e de certeza que lhe roga pragas pelas costas e põe sal atrás das portas.

- A Vizinha Simpática

Situação: Você acaba de se mudar para uma casa nova onde não conhece ninguém. Não sabe a que porta bater se o telemóvel pifar, o cão tiver um ataque de histeria ou entrar uma barata pelo cano do lava-loiças. Sente-se uma alma desamparada num caixote com muitas gavetas, e amaldiçoa o dia em que decidiu ser independente.

Sonho: Nos filmes a malta tem sempre um vizinho louro e simpático e incompreensivelmente solteiro, apesar de ser louro, simpático e com casa própria. A malta vai-lhe bater à porta porque precisa de um ovo e no episódio seguinte já estão enroladinhos à lareira a escolher o nome dos filhos.

Realidade: Ao fim de um tempo, faz finalmente amizade com a D. Albertina, do 5º esquerdo. Desvantagem: a D. Albertina é como os rotweillers, quando ferra não larga. A D. Albertina faz-lhe esperas para lhe contar a sua vidinha de uma ponta à outra, do filho que casou e foi para a Suíça e partir daí nunca mais ninguém o viu, até ao primo Anacleto que era tão bom rapazinho e coleccionava escaravelhos e veja lá, deu em drogado, ‘então e a menina, tem namorado? Ah não? Porquê? Olhe que essas coisas não se podem arrastar, olhe depois chega aos 40 e não encontra homem que a queira.’ Ainda por cima, arrasta cómodas corredor fora até às 4 da manhã (deve ser promessa, porque ninguém tem assim tanta cómoda para arrastar) ou depois ouve o Frei Hermano da Cãmara até às 4, porque tem insónias e é surda.

- A Companheira de Viagem

Situação: De repente, apeteceu-lhe tirar uns dias só para si. Uns dias para ir a algum sítio onde a mão do Homem nunca pôs o pé. Ou enfim, a qualquer sítio mais exótico que Cascais. Problema: detesta viajar sozinha, e o Paulinho avisou logo que nos meses mais próximos não podia tirar dias nenhuns porque o chefe andava maldisposto e quando o chefe anda maldisposto, não se lhe pode pedir nem um pacote de açúcar.

Sonho: Decide investigar qual das suas amigas terá um chefe mais bem-disposto que a deixe tirar uns dias para vir a algum sítio mais exótico que Cascais. Encontra a Joaninha, que é um amor de pessoa e sempre teve o sonho de ir a Pequim.

Realidade: Percebe imediatamente que a Joaninha não tem a noção de onde fica Pequim. O avião inda vai no ar há 12 minutos e já ela refila que tem pavor de aviões e que um ministro famoso morreu de tromboflebite numa viagem a não sei onde. Depois quer sempre ir à janela. Protesta que a comida nos aviões é de plástico. Chateia a hospedeira porque precisa de uma manta, depois porque a manta tem muito pêlo e depois porque afinal não quer a manta que deve estar atochadinha de ácaros. Quando chegam, fica de trombas porque está a chover, depois porque na China só falam chinês, são uns ignorantes, depois porque o hotel não é nada como nos folhetos, depois porque o guia cheira mal dos pés, os nativos são todos iguais, e a comida não é nada como no ‘Dragão do Oriente’ lá ao pé de casa dela. Quando a viagem chega ao fim, toda a gente jura que nunca irá mais longe que Cascais. Ou pelo menos, na companhia da Joaninha.

- A Instrutora Loura

Situação: Decide finalmente que desta é que é: vai perder aqueles quilos que a impedem de ser a Giselle Bundchen e vai descobrir finalmente onde é que ficam os trícepes. Enche-se de coragem e inscreve-se num ginásio. Compra um top que lhe deixa o umbigo à mostra, uns ténis daqueles com molas no calcanhar e apresenta-se assim fardadinha no primeiro dia de aulas, com a vaga sensação de não ter estudado a lição.

Sonho: Quando bota os olhos na instrutora, fica mais descansada. A rapariga deve ter metade da idade da sua filha, está vestida de cor de rosa dos pés à cabeça como uma bailarina de caixa de música, e também tem ténis com molas nos calcanhares, o que a deixa mais calma. Podia ir numa procissão mascarada de anjinho.

Realidade: O Anjinho avisa logo que não está ali para brincadeiras e quem quiser uma cena calminha pode iniciar-se no ponto cruz. Parece que baixou um Espírito do Mal que a leva a dizer as coisas mais anti-condizentes com alguém vestido de cor de rosa. Os outros têm todos cara de quem nunca fez ponto cruz na vida, nem qualquer outra ‘cena’ pró sossegado. O Anjinho já ligou a turbina, e o resto da turma tem um ar feroz como se fosse para o Afeganistão depois de amanhã. Dez minutos depois, você parece uma torneira humana. Pouco falta para malhar com as ossadas no chão. Só se lembra da Luísa Castel-Branco a dizer ‘Você é o elo mais fraco, adeus’. No dia seguinte, são precisas quatro tentativas para sair da cama. Doem-lhe todos os músculos, inclusive músculos que não sabia que tinha. Continua a não saber qual deles é o trícepes, mas de certeza que também lhe dói.

-

CAIXA

Como prevenir desilusões
- Investigar bem se aquela é o tipo de pessoa que você procura.
- Não se deixar levar demasiado pela aparência.
- Conhecer-se a si própria: costuma julgar bem as pessoas à primeira vista ou não?
- Racionar o seu tempo: não gaste demasiado tempo de vida com pessoas de quem não gosta.

´"ACTIVA" - 2009

3 comentários:

  1. Aiaiaaiiii, olhem quem eu fui descobrir, ihihihh :)

    ResponderEliminar
  2. LOLOLOL, revi-me na mulher-a-dias tradicional eheheh, embora a minha não me torça o nariz à vida, apenas aos piriritos...gruunfs... E a vizinhaaaa, nada como a minha vizinha do 3º andar que me perguntou durante 5 anos de seguida se eu era nova no prédio! =D

    ResponderEliminar
  3. Mais cómica foi uma certa vez em que, ao abrir a porta do elevador, me deparei com essa mesma vizinha acompanhada de um olho negro e de um senhor. Fiz cara de espanto, já que não é muito normal esbarrar com idosos de olhos negros, num elevador, mas segui caminho (isto é, meti-me no elevador).
    Ia eu clicar no botãozinho para meter a maquineta a andar e heis que a porta do elevador se me abre violentamente! E um senhor (o que acompanhava a vizinha do olho negro), muito aflito, esbracejava "ó menina, por favor não fique a pensar que eu lhe bati!!!"


    =DDDDDDDD

    ResponderEliminar